segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Um Arco Triunfal romano entre as ruas dos Infantes e do Touro?








Um Arco Triunfal romano entre as ruas dos Infantes e do Touro?



Não é novidade esta abordagem ao património arqueológico romano da vetusta Pax Júlia[1]. No artigo anterior destacámos a singularidade do grande capitel adossado compósito/coríntio, descoberto, em 1982, n”Os Infantes”, na rua dos Infantes nº 16. Comparámo-lo ao capitel compósito de coluna, pilastra e meia coluna, da porta romana de Adriano (séc. II), na cidade de Éfeso, Turquia, desenho que agora reproduzimos para que se possa compreender melhor a tentativa de reconstituição que apresentamos de um provável Arco de Triunfo que estaria situado no extremo nascente do fórum de Pax Julia. O contexto arqueológico em que nos baseamos é composto pelos elementos arquitectónicos romanos encontrados entre as ruas dos Infantes (1), do Touro nº15 (2 e 3) e da Torrinha (4), da abside de S. João (5) e das portas medievais de Aljustrel (6). Não há espaço suficiente para reproduzir neste artigo as fotos ou desenhos de todos os achados, mas vamos recordá-los numa breve descrição com a ajuda da planta parcial da cidade.
Do centro da planta, em 1, é proveniente o grande capitel adossado compósito/coríntio, constituído por dois blocos sobrepostos, datável segundo Alarcão (1986, 82)[2] e Antonieta Ribeiro (1999, 145-160)[3] do final do século I ou inicio do II, realçando o professor a relação estilística e até temporal com o Arco de Triunfo de Tito, em Roma, também do final do século I, embora venha a atribuir a um templo ou a uma basílica  a utilização dos capiteis compósitos, conforme a sua dimensão. Portanto, em 1,  além do grande capitel, encontrou-se um outro de coluna com  a altura de 60 cm, da ordem coríntia, com folhas lisas (exposto ao lado do balcão do ex-café-concerto “Os Infantes”), datado do final do século III (RIBEIRO, 1999, 181-185), enquanto na sala “subterrânea”, onde foram descobertos, subsistem o troço de um fuste liso com cerca de 85 cm de diâmetro e estruturas de opus quadratum aparentemente in situ; em 2, na rua do Touro, recolheram-se, em Agosto de 2005, próximo dos números de polícia 15 e 13, um capitel de folhas lisas coríntio, semelhante ao d “Os Infantes” e uma cabeça de Touro muito bem cinzelada (salvaguardadas no castelo), semelhante às duas que se encontravam embutidas na abside da igreja de são João Baptista (5), actualmente expostas no Museu Regional; em 3, na rua do Touro e em 6, nas portas medievais de Aljustrel, encontraram-se os outros dois grandes capitéis compósitos de coluna, também expostos no museu regional e, por último, em 4, no inicio da parte superior da já desaparecida rua da Torrinha, dois grandes fragmentos de cornija, de trabalho plástico semelhante ao dos capitéis compósitos.
Julgamos que, além da evidente relação de proximidade entre os achados - o mais distante, encontrado às portas de Aljustrel, é o capitel compósito menos bem conservado, adaptado a grande pia (devem-no ter levado a rebolar, desde o extremo do fórum, até ao local da sua última aplicação) - há também uma afinidade plástica na sua elaboração.  Igualmente, a toponímia do Touro e os achados respectivos – cabeças de touro (incluindo as que estavam na abside da igreja, orientada para a rua do Touro, aparentemente uma das vias principais, o Decumanos, da cidade romana), capitel coríntio de folhas lisas e o capitel compósito – revelam um contexto arqueológico de grande importância já denunciado pelo pároco de S. João Baptista, Pedro Pires Nolasco, em meados do século XVIII, quando afirmava que só na sua freguesia havia tantas coisas antigas, como as colunas do arco de cruzeiro da igreja, as cabeças de touro, fustes, etc.
Dada a relação contextual que propomos para estes espécimes arqueológicos, há que acertar a datação dos capiteis coríntios de folhas lisas, associados às cabeças de Touro, às cornijas e aos capitéis compósitos e compósito/coríntio, para o final do século I da nossa era, cronologia do grandioso monumento romano a que provavelmente pertenciam.
A título de curiosidade e, pelo menos, para que se recorde, nestes dias de grande afã arqueológico[4], em Beja, localizamos na planta parcial, em baixo, à direita das portas romanas de Vipasca (antiga rua do Buraco, do Muro Baixo e actual dr Brito Camacho), umas estruturas romanas, formadas por grandes blocos almofadados sobrepostos, que nos parecem ser os pés direitos de outra porta pacense[5].

Leonel Borrela




[1] Desde 1983,foram vários os artigos que publicámos sobre achados arqueológicos e tentativas de reconstituição arquitectónica de Pax Júlia, nomeadamente na rubrica “Iconografia Pacense” , in Diário do Alentejo  de 15 de Janeiro de 1983; 22, 29 Setembro e 13 de Outubro de 1995; 30 de Junho  e 7 de Julho de 2006; 17 de Julho de 2009, entre dezenas de outros, consultáveis através do banco de dados da Biblioteca Municipal de Beja José Saramago.
[2] ALARCÃO, Jorge de –“Arquitectura romana”, in História da Arte em Portugal, Lisboa: Publicações Alfa, 1986. Vol.1, p82
[3] RIBEIRO, Maria Antonieta Brandão S. – “Capiteis romanos de Beja”, Beja: CMB, 1999.
[4] Decorre o Colóquio “Beja/Imagens da cidade antiga”, entre 9 e 10 de Fevereiro de 2012.
[5]  “Porta romana inédita em Beja” in Diário do Alentejo ,27 de Outubro de 2006.

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